Linhas Subterrâneas x Linhas Aéreas
Eng. Elet. Vanderlei Felisberti 0 comentários
Linhas Subterrâneas x Linhas Aéreas
Em tempos de aceleração na transição energética, muitas são as questões relativas ao escoamento desta energia e maiores os investimentos. Este cenário apresenta grandes desafios no planejamento estratégico e na adoção de alternativas para a transmissão desta energia, quer seja em corrente alternada, quer seja em corrente contínua (nas longas distâncias) e com emprego de linhas aéreas ou subterrâneas.
Os principais pontos entre as tecnologias das linhas aéreas e subterrâneas e suas características técnicas distintas, trazem vantagens e desvantagens em cada uma delas. Enquanto nas linhas aéreas, predominam as perdas ôhmicas, devido à maior resistência e exposição térmica, nas linhas subterrâneas, as perdas ôhmicas são menores, entretanto, maiores são as perdas dielétricas e capacitivas. A capacitância de uma linha subterrânea, sendo superior à da aérea, provoca um maior efeito térmico e requer um material de reaterro em sua envoltória imediata, com maior capacidade de dissipação térmica.
Com relação à faixa de servidão, na linha aérea, sua largura depende do ângulo de balanço do cabo, classe de tensão e ambiente, ficando em torno de 20 a 70 metros. A linha subterrânea, possui campo elétrico nulo e campo magnético, que se reduz, exponencialmente, ao se afastar de sua linha de centro. Logo, no caso subterrâneo, a largura da servidão fica em torno de 5 metros, somente para permitir o acesso de equipes e equipamentos, em caso de reparo. O campo magnético está em conformidade ao estabelecido para circulação de pessoas na lei nº 11.934/2009, que determina limites à exposição aos campos elétricos e magnéticos, segundo recomendações – OMS e ICNIRP – e aplicação regulamentada pela REN ANEEL nº 915/2021.
Nas questões de manutenção e confiabilidade, os seguintes critérios comparativos são destaques: inspeção; localização; taxa de falhas; e tempo de reparo. A inspeção da linha aérea é mais rápida – é visual e ainda conta com o auxílio de drones. Já na subterrânea, a instrumentação é mais complexa, necessitando de inspeções periódicas frequentes, para identificação de obras de terceiros ao longo da rota da linha, que em geral, costumam ser as principais causas por falhas neste tipo de instalação.
Enquanto isso, a localização de falhas em linhas aéreas, é praticamente imediata. No caso da linha subterrânea, esta ação pode ser mais demorada. Em contrapartida, a taxa de falhas de linhas subterrâneas é bastante reduzida. Porém, enquanto o tempo de reparo das linhas aéreas é pequeno – normalmente horas ou dias – nas linhas subterrâneas, pode levar de semanas a meses, dependendo do planejamento estratégico do concessionário de transmissão.
O impacto ambiental das linhas depende da tecnologia utilizada. No caso das aéreas, elas causam maior interferência visual e paisagística, além de exigirem manejo contínuo da vegetação. Já no modelo subterrâneo, o impacto se concentra na fase de implantação, com escavações e alterações no solo. Após instaladas, as subterrâneas têm menor interferência ambiental e maior aceitação social, sendo mais adequadas para áreas sensíveis. A avaliação deve considerar o ciclo de vida da linha e as características locais.
Um ponto crucial nessa comparação, refere-se ao custo das alternativas. As linhas subterrâneas apresentam um investimento inicial de 5 a 10 vezes superior ao das linhas aéreas, principalmente devido às obras civis, materiais específicos e complexidade de implantação.
Numa análise preliminar, a adoção de uma linha aérea parece a alternativa com a melhor relação custo-benefício. Contudo, a opção da linha subterrânea pode ser a mais recomendada, principalmente nos grandes centros urbanos – senão a única viável – apesar do seu custo superior.
Diante dos atuais desafios da transição energética e da crescente complexidade dos ambientes urbanos e naturais, torna-se essencial que a escolha da tecnologia de transmissão – aérea, subterrânea ou mista – seja fundamentada em uma avaliação criteriosa e multidisciplinar. Essa decisão deve considerar as particularidades geográficas, ambientais, operacionais e socioeconômicas da região de implantação, além das tendências climáticas extremas, que afetam especialmente as linhas aéreas.
A mitigação das desvantagens de cada alternativa passa por um planejamento estratégico robusto, que inclua o detalhamento da área de implantação, o mapeamento de interferências no subsolo, estoque de sobressalentes, planos de contingência, troca de lições aprendidas entre agentes do setor, e o fortalecimento da gestão de ativos, por meio de monitoramento contínuo e análise detalhada de desempenho. Ao integrar essas práticas, aumenta-se, de forma significativa, a confiabilidade, a eficiência e a resiliência da infraestrutura de transmissão, garantindo maior segurança energética no longo prazo.
Interessante observar a experiência de alguns países europeus, que adotaram linhas subterrâneas (inclusive HVDC – longas distâncias) mesmo quando rotas aéreas seriam mais simples e econômicas. A decisão baseou-se na necessidade de elevar a resiliência energética diante de eventos climáticos extremos, reduzir impactos ambientais e atender à pressão social e regulatória. Embora o custo seja significativamente maior, mecanismos como tarifas específicas, legislação favorável e acordos compensatórios, foram empregados para viabilizar estes projetos.
Sobre a autora:
*Carla Damasceno Peixoto é engenheira eletricista formada pela UFRJ, com pós-graduação em Sistemas de Potência pela COPPE/UFRJ (1983–1984) e MBA em Gestão de Recursos Humanos pelo LACTEC-UFF (2018). É membro voluntária do Comitê de Estudo B1 (Cabos Isolados) do CIGRE-Brasil e do Study Committee B1 (Insulated Cables) do CIGRE Internacional. Atua como Coordenadora do Customer Advisory Group (CAG), além de representar neste comitê o grupo Women in Energy. Foi diretora do CIGRE-Brasil na gestão 2019–2023. Autora de artigo no livro “Energia em Transformação”, lançado em 2025.